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05/08/2022

Plataforma de Ação pelo Agro Sustentável discute o desmatamento

Em encontro com a participação de quatro painelistas que estão à frente de ações de monitoramento e controle do desmatamento no país, o tema foi amplamente discutido

A Amazônia Legal teve a maior taxa de desmatamento dos últimos sete anos. Foi um início de ano devastador para o meio ambiente, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Entre janeiro e junho, a Amazônia perdeu quase 4 mil km² de vegetação, área duas vezes e meia maior que a cidade de São Paulo. A destruição da floresta superou a do primeiro semestre de 2021, que até então tinha sido a maior já registrada. O levantamento do INPE mostra que 79% dos desmatamentos se concentram em três estados: Mato Grosso, Pará e Amazonas – que, sozinho, foi responsável por 31%, mais 1,2 mil km2 de floresta destruída.

Os dados são do sistema DETER, do INPE, que monitora a floresta em tempo real e emite alertas de desmatamento para o governo federal e os governos estaduais. Diante de informações alarmantes como essa, a Plataforma de Ação pelo Agro Sustentável levou o desmatamento à pauta de sua última reunião, realizada em 7 de julho. Cientes da importância de se engajar a cadeia de valor do agronegócio no tema, a Plataforma promoveu um painel levando os representantes do INPE, MapBiomas, Imaflora e TNC para expor o cenário do desmatamento e as principais ações de mitigação das entidades.

O especialista em Sensoriamento Remoto do INPE, Luis Maurano, explicou como funcionam os sistemas PRODES e DETER, principais ferramentas de acompanhamento do desmatamento na Amazônia, no Cerrado e nos demais biomas. O PRODES, ou Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite, monitora o desmatamento por corte raso na Amazônia Legal e revela desde 1988 as taxas anuais de desmatamento na região. O DETER é um levantamento rápido de alertas de evidências de alteração da cobertura florestal na Amazônia, desenvolvido para dar suporte à fiscalização e controle de desmatamento e da degradação florestal realizadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e demais órgãos vinculados.

Maurano lembrou que o INPE tem uma tradição muito grande no segmento de sensoriamento remoto aplicado ao desmatamento e queimadas na Amazônia, desde os anos 70 e 80. O especialista também reforçou que a grande missão da instituição é verificar a perda de vegetação primária e orientar as iniciativas não governamentais ao compartilhar dados do PRODES e do DETER. O especialista do INPE comentou que hoje eles fornecem mapas com dados de desmatamento para o Bioma Amazônia e Cerrado e, em breve, ampliarão o monitoramento para os biomas Pampa, Caatinga, Mata Atlântica e Pantanal.

Marcos Rosa, que é o coordenador técnico do projeto MapBiomas, destacou que a entidade representa uma rede de instituições da sociedade civil, incluindo universidades, ONGs, empresas privadas que tem por objetivo produzir mapas de ocupação da terra, principalmente para analisar as emissões de gases do efeito estufa, desde 1985. O propósito do MapBiomas é contribuir para o entendimento da dinâmica do uso do solo no Brasil e em outros países tropicais tendo como bases principais desenvolver e implementar uma metodologia rápida, confiável e de baixo custo para gerar mapas anuais de cobertura e uso do solo do Brasil; criar uma plataforma para facilitar a disseminação da metodologia para outros países e regiões interessadas utilizando a mesma base de algoritmos; estabelecer uma rede colaborativa de especialistas nos biomas brasileiros para o mapeamento da cobertura do solo e da sua dinâmica de mudanças. O trabalho em rede com instituições responsáveis por diferentes biomas e temas transversais pretende otimizar as soluções com processamento distribuído e automatizado em parceria com Google Earth Engine. Também pretende-se gerar uma plataforma aberta, multiplicável e com possibilidade de aplicação em outros países e contextos. A ideia central é que essa plataforma seja colaborativa – desenhada para incorporar e acolher as contribuições da comunidade científica e demais interessados em colaborar.

Marcos mostrou a evolução do uso da terra no Brasil ao longo dos anos, entre 1985 e 2020. Na região hidrográfica do Paraná, de 1985 a 2020, quase não ocorre desmatamento, a floresta permanece praticamente estável e existe substituição da pastagem por cultivo de soja e cana-de-açúcar, principalmente. Na região de Foz do Iguaçu, observa-se a expansão urbana, mas também o processo de recuperação da borda do reservatório de Itaipu. Além de fornecer dados históricos, o MapBiomas utiliza dados de outros provedores, como o DETER do INPE, fornecendo um sistema de alerta de desmatamento de forma mais acessível e emitindo laudos a partir de cruzamento de dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR), por exemplo.

Em 15 de julho, alguns dias após o encontro, foi lançado o último relatório do MapBiomas, apontando um aumento de 20% de desmatamento no país. Foram 59.181 imóveis com desmatamento detectado no país em 2021, que representam 0,9% dos imóveis rurais cadastrados no CAR até 2021. São reincidentes 19.953 imóveis registrados no CAR por terem desmatamento registrado em 2019 e/ou 2020. Quando considerado o período de 2019 a 2021 o número de imóveis com pelo menos um evento de desmatamento detectado sobe para 134.318, o que representa 2,1% dos imóveis rurais brasileiros. Portanto, não foi detectado desmatamento nos últimos 3 anos em 98% dos imóveis rurais.

Além dos alertas sobre o desmatamento, a mitigação dessa prática depende de iniciativas que estimulem boas práticas. O engenheiro agrônomo responsável pelos programas Boi na Linha e Soja na Linha do Imaflora – Lisandro de Souza explicou que os programas têm como objetivo aumentar a transparência e a efetividade da cadeia de suprimentos através da adoção de boas práticas de conservação ambiental. Segundo Souza os projetos buscam atingir este objetivo promovendo alinhamento entre os diferentes elos da cadeia de valor da carne bovina, por meio do monitoramento dos fornecedores com critérios claros e precisos; auxílio na melhoria das auditorias das compras de gado, unificando regras e procedimentos; aumento da transparência dos resultados, com dados e informações atualizados; treino dos diferentes elos para implementação das ferramentas desenvolvidas. A plataforma Boi na linha conta com um serviço online para facilitar o acesso e dar transparência aos dados e informações. Ela interliga produtores, frigoríficos, varejistas, curtumes e investidores em torno dos mesmos compromissos socioambientais. Também funciona como uma fonte de dados para a sociedade civil acompanhar a evolução desses compromissos. Entre as ações bem sucedidas do projeto, o painelista ressaltou a articulação para assinatura do Protocolo Unificado de Monitoramento de Fornecedores de Gado que foi oficializado em 2020, sistematizando os critérios contidos no TAC da Pecuária, no TAC da Carne Legal e no Compromisso Público da Pecuária. O Protocolo nesta primeira versão cobre o monitoramento dos fornecedores diretos (os últimos que engordam o gado para venda aos frigoríficos). Unificar esses métodos estabelece a referência oficial para o controle dos fornecedores de gado diretos quanto ao desmatamento ilegal, trabalho escravo e existência de áreas embargadas pelo Ibama ou invasões de Terras Indígenas e Unidades de Conservação.

Thiago Masson, coordenador de Conservação da The Nature Conservancy (TNC) no Brasil, mostrou que a entidade já contabiliza 40 milhões de hectares preservados nas ações que lidera. Destacou os principais biomas dos projetos sob sua responsabilidade: Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica. Enfatizou que a agricultura regenerativa é importante para preservarmos a biodiversidade e garantirmos segurança alimentar. Masson apresentou projetos relacionados à TNC e empresas privadas do agronegócio voltados à integração de sistemas agrícolas, soluções financeiras, créditos de carbono e cooperação entre os setores público e privado. Por fim, mostrou o programa REVERTE que tem como meta recuperar 1 milhão/ha de pastagens degradadas até 2026. Serão oito beneficiados, 19 fazendas nos estados de MT, GO e TO. Com mais de 32 milhões de dólares financiados no total.

Ficou evidente no debate que a mudança dessa realidade ambiental só será possível com a sinergia entre a esfera pública e privada. A necessidade de políticas públicas mais direcionadas e de desempenho eficaz do Estado quanto à regularização ambiental é urgente, para que se possa avançar nesse tema e reduzir a insegurança jurídica de quem atua no setor. O cumprimento efetivo do Código Florestal vinculado ao compartilhamento das informações junto ao setor financeiro representa uma estratégia importante neste contexto. Por fim, a manutenção da floresta em pé, dado o seu papel na captura de carbono, pagamento por serviços ambientais e potencial no mercado de carbono é um tema que deverá ser amplamente debatido no Brasil. Nesse cenário, a Plataforma de Ação pelo Agro Sustentável poderá ser uma peça-chave para apoiar essa transformação, uma vez que reúne organizações de diversos segmentos da cadeia produtiva.

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