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02/06/2022

Você sabe o que são Finanças Sustentáveis?

O Entre Solos foi buscar a resposta com um dos maiores especialistas em finanças sustentáveis, Luiz Gabriel Azevedo, que é chefe da Divisão de Meio Ambiente, Social e Governança do BID Invest

Em tempos de mudanças climáticas afetando o mundo, pandemia, inflação acelerada, desmatamento crescente e empresas são cada vez mais pressionadas por seus clientes, investidores, pela sociedade e até pelo governo a seguirem a cartilha das boas práticas ambientais, sociais e de governança corporativa. Temas que se encontram na agenda ESG – Environmental, Social and Governance, que defende ações direcionadas à preservação do meio ambiente, à sustentabilidade e a desenvolver estratégias financeiras para criar valor para a sociedade e investir em um futuro sustentável. Nesse contexto é que se inserem as “finanças sustentáveis”. Conversamos com o Luiz Gabriel Azevedo, chefe da Divisão de Meio Ambiente, Social e Governança do BID Invest para entender como esses investimentos funcionam. Confira.

O que são finanças sustentáveis?

O conceito de finanças sustentáveis se refere às operações financeiras que têm um objetivo de também alavancar ou promover benefícios sociais, ambientais ou de governança. Digo “também” porque são instrumentos financeiros que visam gerar benefícios para as empresas. Um exemplo muito conhecido, que está crescendo no Brasil, são as debêntures temáticas, debêntures verdes, debêntures sociais. Esse é um exemplo, através do qual as empresas, através do mercado de capitais, conseguem se financiar. Se é verde, tem um conjunto de critérios, se é azul, tem outro conjunto de critérios. Outro instrumento que está crescendo muito, e que o BID Invest também já está fazendo, são empréstimos ligados a objetivos sustentáveis.  No setor de proteína animal, um cliente que está fazendo investimentos em tecnologias ou em gestão para diminuir suas emissões de carbono recebe um empréstimo. No entanto,  se o cliente pretende reduzir um percentual maior poderá receber um incentivo financeiro para reduzir as taxas de juros desse empréstimo.

Outra modalidade que operamos muito é a chamada blended finance, que é um mix, onde se traz recursos incentivados, concessionais, com taxas muito baixas, prazos muito longos de doadores, por exemplo, o Fundo Verde do Canadá, e você faz uma mescla com o nosso recurso do BID Invest para reduzir o custo final do cliente.

A quem esse tipo de investimento se destina?

Se destina a qualquer setor, a qualquer empresa, onde o agronegócio tem uma oportunidade incrível. Basta desejar construir o que eu chamo de uma solução ganha ganha, ganha o negócio e ganha o planeta, ou ganha o negócio e ganha o social, você pode até chamar ganha, ganha, ganha. Então eu acho que se pode destinar a qualquer atividade: infra-estrutura, manufatura, turismo sustentável e agronegócio, desde que você esteja disposto a trabalhar para criar essas soluções ganha, ganha, ganha.

Qual a principal contrapartida para empresas, especialmente do agronegócio brasileiro?

A América Latina tem, como um todo, 14% da produção global e 23% das exportações de agricultura e commodities de proteína animal do planeta. Nós temos 15% da terra agricultável, temos uma densidade baixa, de menos de 0,4 habitantes por hectare. Nós temos um clima tropical que permite que em várias áreas da agricultura tenhamos duas, às vezes duas colheitas e meia, enquanto nos países não-tropicais você só pode ter uma por ano, e como região nós temos 33% da água doce do planeta, o Brasil é o campeão nisso. Qual é a contrapartida das empresas do agronegócio brasileiro? É capitalizar nesta oportunidade. É se desafiar. É dizer: nós já somos campeões de produtividade no Brasil, seja na soja, seja na carne, e em tantos outros setores. A tecnologia nós temos. Mas é ainda um setor que, tanto dentro quanto fora do Brasil, às vezes é vilanizado. Então a grande oportunidade para o agronegócio brasileiro é acessar capital, acessar novas fontes de financiamento, aumentar sua produção, sua produtividade, e fazer isso de uma forma que vai contribuir para fortalecer a reputação positiva que o setor deve ter, para desvilanizar o setor. Nós temos que acabar com essa coisa que acontece em vários países da América Latina e no Brasil de colocar o meio ambiente contra o agronegócio e vice-versa. Não existe nenhuma razão para que esses objetivos não possam caminhar juntos. E o Brasil por sua riqueza natural, por sua diversidade, tem uma enorme oportunidade de construir essa solução.

Em que patamar o Brasil está no mercado de finanças sustentáveis?

Os números variam muito. Diante da imensa oportunidade que o Brasil possui, campeão mundial de produção e exportação em tantas commodities do agronegócio, o Brasil e o setor ainda estão muito acanhados em acessar, em evoluir nas finanças sustentáveis. A América Latina toda. Apenas para lhes dar alguns dados, a Bloomberg fez um estudo recente em que estimam que em 2025, daqui a três anos, o mundo vai ter cerca de 53 trilhões de dólares sob administração ligados a ativos sustentáveis, finanças sustentáveis, ESG. Hoje, o percentual da América Latina toda é menor que 4%. Por outro lado, nós temos todas as condições para captarmos uma parte bem maior. E por que isso? Porque nós temos ativos que são ativos globais, o Cerrado, a Amazônia. Produzir nesses biomas de forma sustentável é um ativo global, que vai atrair investidores que querem investir com impacto positivo. Nós temos desafios sociais no Brasil. Você produzir com inclusão, contemplando minorias, é uma oportunidade de atrair investidores que querem atuar nesse ecossistema sustentável.

Em 2020, há estimativas que o país fechou 43 operações ligadas à ESG sustentáveis, totalizando 30 bilhões de reais. Em 2021, chegamos a 109 operações de 85 bilhões de reais. Então, houve um crescimento exponencial. Isso mostra que o Brasil está na direção certa, mas pode fazer mais.

Existem previsões, metas de aumento da participação brasileira nesse mercado?

Arrisco dizer que não chegamos nem a 10% do total. O agronegócio brasileiro tem um potencial enorme, para que através da sua competência, da tecnologia e do trabalho de grupos de empresas como as que estão no Pacto Global e com parceiros como nós, BID Invest, a gente possa elevar a participação brasileira nesse espaço de finanças sustentáveis, e do agronegócio em finanças sustentáveis, para um patamar muito mais alto. Acho que o céu é o limite. Mas precisam ocorrer mudanças genuínas, arrojadas, demonstráveis, temos que ser ambiciosos, onde queremos chegar e o que podemos fazer. Vis a vis, inclusão social, distribuição de riqueza, conservação ambiental, conjugada à produtividade. E nós temos a tendência inovadora e tecnologia para isso no Brasil. É mais necessário se unir em torno desses objetivos, como o Pacto Global vem fazendo.

Qual a mensagem que você deixaria aqui no Entre Solos para o público do agronegócio e também para a população urbana sobre Finanças Sustentáveis no Brasil?

ESG como também é usado aqui no Brasil não é moda. É um caminho sem volta que vai definir uma nova ordem econômica, o futuro do planeta e das próximas gerações. Porque não é moda, abraçar essa agenda e liderar essa agenda, é uma decisão inteligente de negócio. Essa é a minha mensagem. É embarcar nessa canoa e ser o timoneiro, ser o capitão dessa canoa, é uma decisão de negócio. Bom para o planeta, para o social e para o bolso.

Quem é Luiz Gabriel Azevedo

Luiz Gabriel Azevedo é chefe da Divisão de Meio Ambiente, Social e Governança do BID Invest. Trabalhou em projetos de desenvolvimento em cerca de trinta países durante mais de vinte e cinco anos, sendo seu foco o desenvolvimento de infraestrutura, o gerenciamento de recursos naturais, a agricultura e o gerenciamento ambiental. Trabalhou para instituições como o Banco Mundial, o World Wildlife Fund for Conservation – WWF, e a Construtora Norberto Odebrecht. É membro da International Hydropower Association, a American Society of Civil Engineers e o Comitê Brasileiro da Comissão Internacional de Grandes Barragens (CIGB). É membro e foi Presidente da Associação Brasileira de Recursos Hídricos (ABRH), e foi membro do Conselho Deliberativo do FUNBIO (Fundo Brasileiro de Biodiversidade). Foi agraciado com o Prêmio Mosonyi de Excelência em Hidreletricidade, pela sua contribuição profissional ao desenvolvimento hidrelétrico sustentável. Tem produzido numerosos artigos e capítulos para diversos livros. O senhor Azevedo é engenheiro civil com mestrado (M.Sc.) e doutorado (PhD) em Engenharia (Hidrologia e Gerenciamento de Recursos Hídricos) pela Colorado State University, USA

 

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